Este texto foi publicado originalmente na newsletter do Eixo XYZ.
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Minha relação com as redes sociais mudou bastante nos últimos anos. Minha visão dessas plataformas como aliadas deu lugar a uma noção mais pessimista, talvez por eu ter me tornado mais cínico durante a última década e a realidade inflexível do mundo criar uma casca de resistência contra sonhos à minha volta (será que um dia conseguirei quebrá-la?).
Lembro quando o Instagram costumava ser uma rede social muito mais simples. Você postava fotos despretensiosas, aplicava filtros toscos e bregas com tons de cor exagerados, comentava nas fotos de amigos e era basicamente isso. Quem dera continuasse sendo.
Desde que o Instagram se tornou um Monstro de Frankenstein do Mark Zuckerberg, sendo agora uma colcha de retalho repleto de ideias mirabolantes em um único aplicativo, tenho procurado usá-lo cada vez menos. E conforme os anos passavam, me dava conta de como a rede social afetava cada vez mais minha autoestima, até ficar insustentável.
Eu nunca fui uma pessoa de se achar bonita. Eram e ainda são raros os momentos que olho no espelho e gosto do que vejo, e nos últimos anos de Instagram esse pensamento se tornou pior, seja pelos corpos lindos que apareciam na linha do tempo ou nos Stories, seja pelos sorrisos largos e aparentemente felizes um atrás do outro, pelas companhias igualmente lindas em festas e bares instagramáveis ou pela minha simples falta de autoestima. Eu queria tanto ser como eles, queria tanto um rosto menos redondo, uma mandíbula pronunciada, ter estilo, ser desejado.
Mas eu me policiava muito bem. Quando notava que estes pensamentos estavam surgindo na minha cabeça eu tentava afastá-los de duas formas: desinstalando o Instagram ou desativando minha conta. A primeira opção ainda me deixava usando a rede social na web, mas ainda assim os corpos bonitos e os sorrisos largos apareciam é claro, então eu acabava por desativar minha conta de qualquer jeito.
E esses momentos eram seguidos por alívio. Alívio de não precisar tirar uma foto minha e me mostrar nos Stories — e o melhor: não me ver depois. Alívio por não ter a pressão de postar fotos bonitas da coisa mais banal possível. Alívio de não ver os corpos perfeitos enquanto eu não fazia o mínimo esforço para mudar o meu.
Eu estava empacado. Desde julho de 2022, desde que eu peguei covid, minha vida não foi a mesma. Estava indo bem no retorno à academia durante a primeira metade daquele ano, mas a sucessão de eventos da doença me fez ficar de fora por alguns dias. Depois por algumas semanas. E então por alguns meses. Até hoje ainda luto para voltar à academia nem que seja um único dia na semana e preciso trabalhar minha pequena ansiedade e desconforto que, por algum motivo, comecei a sentir como consequência da covid.
Isso foi responsável por me fazer engordar alguns quilos e por me fez sentir mais desconfortável comigo mesmo. Meu rosto parecia ainda mais redondo, então eu apelava para os filtros que mascaravam isso deixando-o mais estreito e disfarçando de um jeito ou de outro.
Com o passar do tempo deixei de postar fotos minhas, até que finalmente deixei de postar fotos. Estava querendo uma conta mais pessoal, então deixei de seguir centenas de pessoas e removi ainda mais centenas de seguidores. Removi as fotos relacionadas a tecnologia, agora era só eu e a natureza. Mas a rede social já havia perdido a graça. Não fazia sentido estar ali enquanto as mesmas questões martelavam na minha cabeça, não importava quem eu seguia ou deixava de seguir.
Então finalmente desativei o Instagram de forma mais definitiva para começar o ano um pouco mais leve e sem tanta pressão comigo mesmo. Mas ainda fica o vazio da comunicação. Ao mesmo tempo que me torturava, era divertido ver o que as pessoas estavam fazendo, onde estavam, com quem estavam. Comentar e responder as interações. Não tenho isso hoje. Tenho quase nada disso hoje. Mas acredito que seja um preço pequeno a pagar pela melhora da saúde mental.
Tenho agora um entendimento melhor do que há um ano atrás, mas ainda há um grande caminho a seguir para me entender mais. Meus problemas não acabaram quando desativei minha conta do Instagram. Queria eu que tivessem. Mas essa decisão foi responsável por melhorar meu humor, a forma com que me vejo e como lido com minha imagem. Minha vida sem Instagram é um pouco melhor, mas tem muito o que melhorar.
A verdade é sempre clichê. E uma dessas verdades clichês é que a gente está sempre em uma constante descoberta para tentar entender aquilo que somos. Então vamos tentar, de preferência com menos redes sociais.
Na sexta edição da Nos Eixos, a newsletter do Eixo XYZ, também comento sobre algumas notícias da semana e te recomendo três coisas para ler, ver e ouvir esta semana, incluindo o impactante livro de memórias da Jannette McCurdy, intitulado Estou Feliz que Minha Mãe Morreu, a estreia de The Last of Us que pode mudar para sempre a expectativa de adaptações de jogos e o eufórico álbum Caprisongs de FKA twigs.
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